Em maio de 2024, o Tribunal do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (“CADE”) aprovou, por unanimidade, o pedido da Petrobras para renegociar as condições de dois Termos de Compromisso de Cessação (“TCCs”) assinados junto ao CADE em 2019 no contexto de uma investigação de suposto abuso de posição dominante.
Nos TCCs originais, a Petrobras havia acordado desinvestir oito unidades de refino em todo o país e quatro distribuidoras de gás, mas o plano de desinvestimento foi revogado pelo Presidente da República em 2023. De acordo com os novos termos renegociados, a Petrobras não é mais obrigada a alienar os ativos remanescentes: cinco refinarias e uma distribuidora de gás.
No entanto, o CADE supervisionará os preços praticados durante os próximos três anos e a Petrobras tornará públicas as suas políticas comerciais gerais para o fornecimento de petróleo, visando assegurar preços não discriminatórios. Em relação ao setor de gás, a Petrobras indicará membros independentes para o conselho de administração da distribuidora de gás mantida. De acordo com o Tribunal do CADE, os aditivos aos TCCs também incluem mecanismos robustos de monitoramento.
Em março de 2024, o Tribunal do CADE reconheceu uma infração de gun jumping cometida por duas empresas de tecnologia, mas decidiu não aplicar multas, uma vez que as decisões anteriores sobre a definição de grupo econômico envolvendo fundos de investimento, para fins de preenchimento dos critérios de notificação obrigatória, não eram claras e consistentes. A decisão forneceu orientações relevantes sobre a matéria.
Em primeiro lugar, o Tribunal identificou que as regras aplicáveis apenas a operações em que os fundos de investimento estão diretamente envolvidos (e.g., na figura de comprador) tinham sido erroneamente aplicadas a casos em que os fundos estavam indiretamente envolvidos (e.g., por participação no comprador), esclarecendo que tais cenários devem ser diferenciados: apenas no primeiro caso a composição do grupo econômico deve incluir o grupo de cada cotista que detenha direta ou indiretamente pelo menos 50% das cotas do fundo envolvido na operação, individualmente ou por qualquer tipo de acordo, para além da parte diretamente envolvida (ou seja, o próprio fundo), suas controladas e as empresas em que este detenha, direta ou indiretamente, pelo menos 20% do capital votante ou total.
Em segundo lugar, o Tribunal identificou que, ao longo dos anos, o CADE empregou diferentes abordagens para avaliar se uma entidade está sujeita a controle unitário ou compartilhado, particularmente na análise dos direitos dos acionistas minoritários. Entendeu-se que, em regra, a análise de caraterização de um grupo, para fins de verificação da obrigatoriedade de notificação, deve considerar os direitos atribuídos aos acionistas pelos documentos de governança (e.g., acordo de acionistas), tais como direitos de veto e de indicação de membros dos órgãos de governança. Nesse contexto, salientou-se que, para que o controle unitário seja reconhecido, é necessário verificar determinadas condições, incluindo a capacidade de o acionista controlador estabelecer estratégias empresariais de forma independente. Quando não existe um controlador único claramente identificado, presume-se que o controle é compartilhado entre os acionistas.
Nas últimas sessões de julgamento, o Tribunal do CADE tem discutido cada vez mais a aplicação de novos parâmetros na dosimetria de multas decorrentes da consumação prévia de atos de concentração sujeitos à análise prévia do CADE, prática conhecida como gun jumping. Objetiva-se garantir a proporcionalidade da sanção e fomentar acordos.
Em casos recentes, o Tribunal do CADE tem considerado que as multas por gun jumping devem ser limitadas a 20% do valor da operação, exceto nos casos em que a conduta é intencional. Além disso, o CADE concedeu um desconto adicional de 10% no valor da multa em razão da pactuação de acordo com o CADE.
Em abril de 2024, o Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, reprovar uma operação de aquisição, por uma empresa fabricante de gesso drywall, da totalidade das ações de seu concorrente, o qual possui uma única planta produtiva. Essa é a primeira operação reprovada pela nova composição do Tribunal do CADE.
Em sua análise, o Tribunal identificou que a operação diminuiria o número de concorrentes no mercado de quatro para três, elevando substancialmente a sua concentração após a operação, tanto nacional quanto regionalmente. Ademais, o Tribunal entendeu que o mercado já apresentava barreiras significativas à entrada, como demonstrado pela falta de produtos substitutos para o drywall e pela ausência de novos entrantes, apesar de seu crescimento.
De acordo com a decisão do CADE, os remédios estruturais eram inviáveis, considerando a natureza da operação e a indivisibilidade do único ativo-alvo. As requerentes propuseram remédios comportamentais relacionados ao volume mínimo de produção e ao controle de preços, mas eles foram rejeitados, pois sua implementação seria ineficaz para mitigar as preocupações concorrenciais.
O Tribunal do CADE, por unanimidade, arquivou um processo administrativo instaurado contra uma empresa fabricante de pneus e sete de seus revendedores por suposto cartel de fixação de preços. A investigação, iniciada a partir da denúncia de um concorrente, buscava apurar a licitude da prática de fixação de preço mínimo de revenda implementada por meio de uma política comercial aplicada à rede de revendedores da empresa.
O Conselheiro Relator Gustavo Augusto sustentou que, consoante a jurisprudência do CADE, há distinção entre fixação de preço de revenda e cartel. De um lado, a fixação de preço de revenda pode ser uma estratégia comercial lícita para a organização dos revendedores de uma determinada marca, salvo se causar danos ao consumidor ou configurar abuso de posição dominante. De outro lado, o cartel seria um ato ilícito per se. Portanto, por si só, um fornecedor pode licitamente estabelecer preços a serem observados pelos revendedores de sua marca.
No caso, apesar da elevada participação de mercado da representada, o CADE entendeu ser improvável que a conduta produzisse efeitos anticompetitivos, tendo em vista (i) a racionalidade econômica da prática; (ii) o estabelecimento de preços no âmbito exclusivo de uma competição intramarca; e (iii) a insuficiência de provas para justificar uma condenação por cartel.
Em abril de 2024, o Tribunal do CADE concluiu o primeiro julgamento de processo administrativo relacionado à Operação Lava Jato. A investigação, iniciada em 2016 a partir da celebração de um Acordo de Leniência, apurava um suposto cartel em licitação destinada à urbanização de comunidades localizadas no Rio de Janeiro/RJ. A multa imposta aos condenados totalizou aproximadamente R$ 22 milhões.
Inicialmente, o então Conselheiro Relator Sérgio Ravagnani, acompanhado pela então Conselheira Lenisa Prado, votou pelo arquivamento do caso em favor de oito dos nove indivíduos representados e pela condenação de todas as seis empresas investigadas. Ainda, votou pela extinção da ação punitiva quanto aos signatários do Acordo de Leniência e suspensão do processo quanto aos compromissários de TCCs.
Entretanto, o Presidente Alexandre Cordeiro apresentou voto-vista divergente, sendo acompanhado pela maioria do Tribunal. A partir da reinterpretação do conjunto probatório, ele defendeu a absolvição de quatro das seis empresas e de seis dois nove indivíduos representados. Ademais, decidiu pela condenação de uma empresa em relação a qual o processo estaria suspenso devido à declaração de descumprimento de TCC ocorrida após a apreciação inicial do caso pelo Conselheiro Relator. Assim, por maioria, três empresas e dois indivíduos foram condenados.
Por fim, o Presidente Alexandre Cordeiro divergiu também da dosimetria originalmente proposta com base em critérios de vantagem auferida, aplicando a metodologia clássica baseada no faturamento bruto por sub-ramo de atividade das empresas, a partir da qual o valor das multas aplicadas reduziu significativamente.
Por meio de consulta ao Tribunal do CADE, duas empresas do mercado de varejo e aquisição de materiais de construção questionaram a legalidade da criação de um comitê de compras conjuntas para negociar condições gerais de fornecimento com seus principais fornecedores em todo o território nacional, visando obter maiores descontos e reduzir custos de transação e logística.
O Tribunal do CADE, por unanimidade, declarou que a conduta seria lícita, considerando a reduzida participação de mercado das empresas e o baixo volume de compras, incapaz de estabelecer poder de monopsônio.
Ademais, no que se refere ao controle de atos de concentração, o Conselheiro Relator Carlos Jacques sustentou que o memorando de entendimentos apresentado pelas empresas não se enquadra como contrato associativo, uma vez que não há (i) empreendimento comum ou (ii) compartilhamento de riscos e resultados.
O CADE publicou dois novos guias: (i) o Guia V+, um guia para análise de atos de concentração não horizontais que tem como objetivo auxiliar os agentes de mercado na compreensão das etapas, técnicas e critérios utilizados pelo CADE no controle de atos de concentração verticais e conglomerais, representando uma fonte para a tomada de decisões comerciais; e (ii) o Manual Trustee, um guia que orienta as atividades dos trustees quanto ao monitoramento de decisões, compromissos e acordos em âmbito concorrencial, abrangendo tanto o controle de atos de concentrações quanto o controle de condutas anticoncorrenciais.
Recentemente, a Secretaria de Comércio Exterior (“SECEX”) iniciou investigações antidumping referentes às seguintes exportações ao Brasil:
Ademais, a SECEX (i) iniciou a revisão do direito antidumping aplicado às importações de PVC-S originárias dos Estados Unidos; (ii) iniciou a revisão do direito compensatório aplicado às importações de corpos moedores em ferro fundido e/ou aço ligado ao cromo originárias da Índia; (iii) encerrou a revisão de final do período sobre o direito antidumping aplicado às importações de filme de PET originárias da Turquia; e (iv) encerrou a investigação antidumping em face das importações de aços pré-pintados originárias da China, pois a necessária verificação in loco não foi realizada.
Conforme Circular SECEX nº 2/2024, as medidas de defesa comercial aplicadas aos seguintes produtos expirarão no 2º semestre de 2024: (i) laminados planos de baixo carbono, originários da África do Sul, China, Coreia do Sul e Ucrânia (02.10.2024); (ii) laminados planos de aços inoxidáveis austeníticos, originários da China e Taipé Chinês (02.10.2024); (iii) alhos frescos ou refrigerados, originários da China (03.10.2024); (iv) etanolaminas – monoetanolaminas (MEA) e trietanolaminas (TEA), originárias dos EUA e Alemanha (01.11.2024); (v) cadeados, originários da China (13.11.2024); (vi) escovas para cabelo, originárias a China (22.11.2024); (vii) alto-falantes, originários da China (29.11.2024); (viii) pneus de motocicleta, originários da China, Tailândia e Vietnã (19.12.2024); (ix) fios de náilon, originárias da China, Coreia do Sul e Taipé Chinês (23.12.2024).
As partes interessadas na prorrogação das medidas poderão apresentar petição para iniciar revisão de final de período, que deverá ser protocolada até quatro meses antes do encerramento da sua vigência. Caso as revisões sejam iniciadas, eventuais interessados poderão participar ativamente dos processos.
Denise Junqueira
djunqueira@cascione.com.br