O Banco Central do Brasil (“BCB”) iniciou na última quinta-feira (dia 14 de dezembro) o aguardado processo de regulamentação das prestadoras de serviços de ativos virtuais (também conhecidas como “VASPs”) no Brasil. Neste sentido, foi publicado o Edital de Consulta Pública nº 97/2023, por meio do qual o BCB visa obter subsídios do mercado para a edição de regulamentação aplicável ao setor.
O Edital de Consulta Pública insere-se no contexto da Lei nº 14.478/22, que estabeleceu o marco legal das VASP, e do Decreto nº 11.563/23, que determinou a competência do BCB para regulamentar o setor. Ambas as normas formam a base para regulamentação no Brasil da crescente indústria de ativos virtuais (também conhecidos como criptoativos).
Embora o BCB costume apresentar uma proposta da norma em seus processos de consulta pública, nesta oportunidade o regulador limitou-se formular 38 perguntas sobre os principais aspectos operacionais associados às atividades das VASPs.
A mudança de formato neste caso específico está ligada ao fato de que o setor de ativos virtuais surgiu recentemente, é extremamente dinâmico e altamente conectado a tecnologias inovadoras, elementos que tornam o trabalho do BCB especialmente desafiador.
As perguntas do BCB foram divididas em 8 temas distintos, resumidos abaixo:
(i) Segregação patrimonial e gestão de riscos: busca informações sobre (a) potenciais medidas infralegais para assegurar a separação patrimonial entre recursos de clientes e recursos proprietários das VASPs; (b) a conveniência de permitir que ativos virtuais de clientes sejam usados como garantia de operações; (c) conveniência de se criar seguro ou fundo garantidor para proteção de valores de clientes; (d) eventuais mecanismos para proteção de clientes no caso de staking (e., uso de ativos virtuais para validar transações na blockchain); (e) vantagens e desvantagens de permitir pagamentos transfronteiriços com ativos virtuais; e (f) formas para compatibilizar normas sobre capitais internacionais com serviços de ativos virtuais;
(ii) Atividades desenvolvidas e ativos virtuais negociados: busca informações sobre (a) quais serviços com ativos virtuais interessam aos participantes de mercado; (b) a conveniência de permitir que instituições financeiras e de pagamento prestem serviços com ativos virtuais; (c) a conveniência de impor a VASPs critérios para selecionar os ativos virtuais disponibilizados aos clientes; e (d) requisitos regulatórios a serem impostos para garantir a segurança na custódia de ativos virtuais;
(iii) Contratação de serviços essenciais: busca informações sobre (a) eventuais garantias a serem requeridas de custodiantes de ativos virtuais e outros prestadores de serviços localizados no exterior; (b) cuidados a serem adotados para cadastro de prestadores de serviços terceirizados (KYS); e (c) procedimentos para prevenção à lavagem de dinheiro, financiamento ao terrorismo e cumprimento de normas cambiais pelos provedores de liquidez;
(iv) Regras de governança e conduta: busca informações sobre (a) armazenamento de chaves privadas e forma para constituição de ônus, gravames e bloqueios judiciais sobre os ativos virtuais; (b) referências para formação de preços dos ativos virtuais negociados em exchanges; (c) mecanismos para identificar e coibir manipulação de mercado e práticas fraudulentas; (d) o fluxo de liquidação de operações de compra e venda de ativos virtuais em VASPs ; (e) formas de garantir a transparência sobre tarifas cobradas, diante da volatilidade de preços dos ativos virtuais; (f) conveniência de requerer percentual mínimo de ativos custodiados em cold wallets; (g) conveniência de permitir que VASPs atuem como provedores de liquidez para clientes; (h) como deve ser caraterizado o controle sobre ativos virtuais; (i) a governança mínima para aderência à legislação e regulamentação por parte das VASPs e possibilidade de uso de certificações para atestar o atendimento deste requisito; (j) os potenciais ilícitos que poderiam ser praticados por meio de transações com ativos virtuais e como mitigar o risco de sua ocorrência; (k) como as VASPs tem atendido o requisito de identificar o beneficiário final de clientes que sejam pessoas jurídicas; e (l) como deve se dar o monitoramento de operações suspeitas de lavagem de dinheiro e como assegurar o cumprimento de normas sobre sanções internacionais;(ii)
(v) Segurança cibernética: busca informações sobre os requisitos necessários para manter a segurança cibernética no setor e mitigar os riscos associados;
(vi) Transparência e proteção dos clientes: busca informações sobre (a) quais as principais informações que devem ser prestadas aos clientes para assegurar transparência sobre riscos das operações; (b) como deve ser estruturada política interna para assegurar a adequação ao perfil do cliente de instrumentos que envolvam a representação de valores ou que possuam mecanismos de estabilização em relação a ativo específico ou cesta de ativos; e (c) informações mínimas a serem prestadas no processo de distribuição de ativos virtuais;
(vii) Regras de transição (aplicável a VASPs em atividade, as quais deverão obter autorização do BCB para continuar operando): busca informações sobre (a) como deve ser regulamentada a transição para VASPs em atividade, quais critérios devem ser levados em considerados para esses fins e qual o prazo ideal para a transição; e (b) quais as principais dificuldades vislumbradas para fins da transição.
(viii) Manifestações gerais: busca informações sobre outros assuntos que sejam relevantes, mas que não tenham sido cobertos nas questões anteriores.
O prazo para envio de contribuições ao Edital de Consulta Pública encerra-se no dia 31 de janeiro de 2024.
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Marcelo Padua Lima
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